domingo, 13 de dezembro de 2015

O meu olhar sobre o Piá: lembranças – Miranda de Amaralina - Biblioteca Padre José de Anchieta e EMEF Brigadeiro Henrique Raymundo Diott Fontenelle

Falamos de nós agora: Contamos e recontamos nos dedos o tempo que se foi. Lembranças da infância, da inocência...  Mas para onde foram aqueles meninos danados?
Nossas fantasias ficaram nas lembranças dos pés descalços, chutando a bola de meia ou uma bola de couro que alguém levava para brincar.
Éramos verdadeiros atores vivendo uma realidade específica, experimentando as coisas do mundo, brincando e fazendo muitas descobertas com a consciência lambuzada de esperança.
 Mas para onde mesmo foi aquela gente?
Pois é, depois de muito tempo, encontrei no Piá o menino que estava escondido.
Quando cheguei neste projeto, achei que fosse dar aulas de percussão para as crianças ou simplesmente dar aulas de musicalização. Claro que em alguns momentos também faço isso, mas o Piá mostra outras possibilidades de trabalho com as crianças. Fez-me retomar o menino que estava guardado dentro de mim: revivi as histórias, as fantasias e as brincadeiras de menino. E, assim, pude me aproximar das crianças e fazer um bom trabalho, porque me senti inteiro junto a elas. Brincando e vivendo muitas histórias e experimentando formas de olhar o mundo com o olhar da infância.
O menino que imaginava voar longe com as pipas e arraias na praia de Amaralinha esteve presente no parque da Escola Henrique Fontenelle e nas salas da Biblioteca Padre José de Anchieta, brincando de inventar histórias.  Como no dia em que a Tâmille chegou um pouco mais tarde na aula e as crianças me perguntaram sobre ela. Inventei uma história imaginária dizendo–lhes que ela tinha ido para a Alemanha com seu marido, mas que viria outra pessoa para substituí-la. Em seguida, Tâmille entrou na sala. Nesse momento, nós dois criamos uma personagem para ela. Dissemos para as crianças que esta era a irmã gêmea de Tâmille, e que o nome dela era Taís. As crianças acreditaram, mas ficaram em dúvida. Líamos nos seus rostinhos: “será mesmo a irmã de Tâmille?”.  
A dúvida esteve presente, mas o mergulho na fantasia foi profundo. Os adultos da escola também entraram no jogo e por vários dias nós vivemos essa fantasia com as crianças. Criamos diversas histórias e situações de brincadeiras, até que chegou o dia em que revelamos a verdade para as elas. Claro que todos disseram: “a gente já sabia!”.  
Mas quem não brincou de faz-de-conta?  Quem não se imaginou um herói,  um artista famoso ou simplesmente brincou de ser a mamãe ou papai?  As brincadeiras imaginárias de faz-de-conta são fundamentais paras as crianças.  As experiências subjetivas atuam em níveis cada vez mais profundos, nos quais desaparecem as divisões entre o que está dentro e o que está fora da imaginação, comunicando a experiência do ser. O brincar opera nessa unidade subjetiva, mobilizando sensações e sentimentos que se expressam através do corpo. Entrar nesse universo das crianças é fundamental para estabelecermos uma comunicação com o universo infantil.
 No encontro com Marina Marcondes, ela nos falou do conceito “agachamento”, que nada mais é do que você entender e se aproximar  do mundo das crianças, e também  enxergar no passado a sua própria história de infância. Porque quando nós, adultos, permitimo-nos entrar nesse universo da infância as coisas ficam muito mais fáceis e prazerosas.
Quando entrei no projeto Piá, percebi que havia feito uma boa escolha. Afinal,  já tive outras experiências com as crianças e me identifico muito com o trabalho com elas. Adoro brincar com as pessoas, conversar, contar histórias sobre a vida. Nasci na Bahia, fui criado à beira mar, num lugar onde as pessoas brincam muito umas com as outras. Também aprendi música e dança na rua, de um jeito muito espontâneo e alegre. A arte fez parte da minha vida desde muito pequeno.
Outro aspecto muito bacana foi o encontro com minhas parceiras de trabalho. Estamos trocando muitas experiências entre nós e com as crianças. Quando cheguei ao projeto, eu tinha um entendimento sobre arte e educação. Aos poucos, com a ajuda das parceiras, fui entendendo o que é o Piá e, ao mesmo tempo, fui me reconhecendo no trabalho, encontrando o meu jeito de ser: o jeito do menino lá de Salvador, que estava guardado na caixinha das memórias.

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